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  • André Bloc

Star Trek: Sem Fronteiras (2016), de Justin Lin


Ainda que efetivos, "Star Trek" (2009) e "Além da Escuridão: Star Trek" (2013), ambos de J. J. Abrams, sempre se dedicaram mais à aventura do que à ficção científica – marca da franquia criada como série televisiva em 1966. Nesse sentido, "Star Trek: Sem Fronteiras", dirigido por Justin Lin ("Velozes e Furiosos 3, 4, 5 e 6") é um avanço imenso.

Apesar de ser focado em questões filosóficas, o roteiro – de Simon Pegg e Doug Junt –, se preocupa a todo momento com noções de exploração, tão importantes para as obras originais, enquanto mantém a lógica interna quase sempre palpável dentro de avanços tecnológicos. Mas se a uma primeira vista o filme parece uma máquina bem oleada, nos pormenores se vê algumas rachaduras que, no mínimo, incomodam.

A ideia de exploração é apresentada de forma brilhante logo na sequência inicial, quando o capitão Kirk (Chris Pine) tenta um tratado de paz com um povo pouco amistoso. O timing de comédia se traduz no roteiro perfeitamente na canastrice de Pine – um reflexo do Kirk de William Shatner –, e o ritmo proposto pelo filme se estabelece bem. Mas aí surgem os conflitos internos de Kirk e Spock (Zachary Quinto) e tudo soa bastante repetitivo. No filme de 2009 havia um ódio mútuo entre os dois. No segundo, a relação virou quase umbilical. No terceiro, obviamente, os dois precisavam se separar.

Em suma, a tripulação da nave USS Enterprise se vê presa em um planeta pouco amigável e perseguida por um temível líder ditatorial chamado Krall (Idris Elba). Justin Lin consegue fazer praticamente todos os personagens secundários da nave crescer, principalmente Uhura (Zoe Saldana), Magro (Karl Urban) e Sulu (John Cho). Na trama, eles encontram um propósito. Eles se tornam protagonistas. Só que Kirk e Spock não são exatamente coadjuvantes.

Com conflitos enfocados em diálogos, a dupla parece pouco avançar, mesmo tomando a maior parte do tempo de tela. É como se o filme não confiasse no elenco de apoio e apelasse sempre para “a lógica de Spock” e o “carisma de Kirk” – recursos já íntimos do público. Quando deparado com o tema central do filme – se união é força ou fraqueza –, a unidade deles destoa do centro dramático. Frases de autoajuda como “O medo da morte é o que nos mantém vivos” ou “nós encontraremos esperança no impossível” aumentam a atmosfera de artificialidade.

Paralelamente, o filme tem dificuldade de desenvolver suas cenas de ação – uma especialidade de Justin Lin. O excesso de movimento (quase sempre rotatório) de câmera causa mais vertigem do que impressiona. Já as soluções do roteiro, que inevitavelmente levam à ação, são sempre simples demais, algo que não combina com o discurso científico que domina o filme. Por outro lado, Krall é um bom vilão para substituir a tridimensionalidade de Khan na obra anterior, mas suas motivações só ficam claras no ato final do filme, o que o diminui.

Entre avanços e retrocessos, "Star Trek: Sem Fronteiras" é um filme que peca pela falta de unidade, enquanto, ironicamente, discute a importância dela. Ainda assim, ao se reconectar com os signos básicos do gênero, o filme consegue manter-se cativante e representa um bom horizonte para o futuro da principal série de ficção científica dos cinemas.

Publicado pelo autor no Jornal O Povo.

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