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  • Thiago César

A Chegada (2016), de Denis Villeneuve


Em tempos onde a ficção-científica no cinema é representada pela ressurreição do fenômeno pop "Star Wars", pela despersonalização de "Star Trek" para se adequar ao grande público e por duas grandes decepções como "Prometheus" e "Interestelar", enquanto obras mais promissoras do gênero são reservadas à cena independente, é revigorante assistir a um filme que trate de questionamentos e conceitos de sci-fi de forma séria e bem desenvolvida.

A princípio, "A Chegada" aparenta ser apenas mais um filme comum de invasão alienígena, com pessoas abismadas assistindo à notícia que doze misteriosas naves apareceram repentinamente e flutuam sobre pontos específicos ao redor do planeta. Porém, a protagonista que acompanhamos já se diferencia pela sua relativa indiferença à situação.

A professora de linguística Louise, interpretada por Amy Adams, é um ponto fora da curva em relação ao caos que se instaura ao seu redor. Inerte, ela vai ao trabalho no dia seguinte como se alheia a um dos maiores eventos da humanidade. Seu “despertar” ocorre apenas quando o Coronel Weber (Forest Whitaker) solicita sua participação na equipe científica que tentará entrar em contato com os seres de outro planeta.

A partir daí, a trama gira em torno da comunicação entre os humanos e os heptapods – como são chamados os alienígenas, por terem sete “pernas”. Inspirado no livro "Story of Your Life", de Ted Chiang, o roteiro de Eric Heisserer é eficaz em destacar a importância deste trabalho ao espectador e envolvê-lo nas etapas de estudo semântico – de forma superficial, mas não desleixada – tornando o segundo ato mais interessante e menos enfadonho.

Isso também se dá pela ótima interação entre o trio de protagonistas (Adams, Whitaker e Jeremy Renner, que interpreta o cientista Ian Donnelly), cujas atuações são competentes, mas nada fora do comum. O real lugar do cientista na trama só é revelado no terceiro ato, em função do arco da personagem de Adams. Isto só não incomoda porque Renner consegue ser carismático ao longo da narrativa, servindo como ponto de apoio emocional para a professora Louise.

O diretor Denis Villeneuve é competente em criar uma atmosfera de mistério e encantamento em relação ao desconhecido. Em momento algum ele desdenha da magnitude do evento que serve de premissa ao longa, estando a surpresa e o medo presentes nos rostos do elenco.

Apesar de não arriscar tanto quanto poderia em termos narrativos, Villeneuve apresenta uma estética pouco comum à sua filmografia, utilizando-se de referências visuais que vão desde o óbvio, mas sempre bem-vindo, "2001 – Uma Odisseia no Espaço", de Stanley Kubrick, até o contemplativo "A Árvore da Vida", de Terrence Malick. A fotografia de Bradford Yound percorre bem entre as duas estéticas, sendo simétrica e parada ou intuitiva em movimento, dependendo do que mostra ou de que sentimento quer despertar no público.

Enquanto a fotografia mostra desenvoltura, o design de produção de Patrice Vermette carece de personalidade. As naves parecem apenas grandes pedras e os heptapods são uniformes e sem expressão. Na provável tentativa de manter o foco no drama humano, sem investir em um visual memorável para os alienígenas, Vermette acaba deixando a impressão de pouca criatividade.

Ainda assim, "A Chegada" é um filme que merece ser respeitado por lidar com temas universais e intrínsecos à história da humanidade. A narrativa quase delirante que demonstra a coesão necessária no momento certo é um ótimo exemplo de como o didatismo deve ser empregado. O longa reconhece que a verdadeira ficção-científica é sobre os elementos mais básicos que nos fazem humanos.

Publicado pelo autor no site Cinemaginando.

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